Tuesday, January 13, 2009

Num sopro de vida...


“Dava-lhe a impressão de que o tempo a ia arrumando com cuidado num canto, como se fosse uma fera cuja fúria não queria atiçar; mas o facto é que a dor permanecia lá. Talvez não tão dilacerante como no principio; transformava-se já em sofrimento crónico, era como o murmúrio do vento a fustigar as folhas, uma chama que ardia em lume brando, um estrépito de fundo que não explodia mas também não morria.”

“Não acompanhava, porém, o sentido das palavras. Limitava-se a mirar o capitão como um sonâmbulo, vendo-o a movimentar a boca como um peixe dentro de água. Voltava a assentir sempre que notava uma pausa e, à primeira oportunidade, desviava a atenção para Amélia, que não lhe largava os olhos, as palavras transformadas em sentimentos, as expressões em carícias.”

“Releu a mensagem e deixou correr um suspiro. Era subtil e certeira; só os mais perspicazes a entenderiam.”



Dorme, mãe Pátria, nula e postergada
E, se um sonho de esperança te surgir,
Não creias nele, porque tudo é nada,
E nunca vem aquilo que há-de vir.

..................................................Fernando Pessoa


José Rodrigues dos Santos, in A vida num sopro

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